segunda-feira, 28 de maio de 2007

Jeu de Balle


Photo by fraggy


É curioso como o poder atrai a si a mistura humana, seja ela de origem étnica, linguística, cultural ou religiosa. Bruxelas é hoje uma cidade (como mais algumas na Europa) que se transfomou na Babel de hoje, na confusão de culturas, línguas e crenças, cada uma com um diferente grau de sedução e assimilação face às outras. E, se virmos bem, encontramos esta mistura social em todos os grupos e classes sociais, do pobre ao rico, do estudante ao funcionário comunitário.

Eu gosto da mistura, das carruagens de segunda classe nos combóios que ligam entre si estas Babéis europeias. Este fim de semana, de Bruxelas a Amsterdão, e sem me levantar da cadeira, consegui reconhecer dez línguas diferentes a passar por mim. Umas de fato e gravata, outras de túnica africana, outras de gosto a sul ou cheiro a oriente. E, dentro da mesma língua, outras tantas origens adivinhadas pelas pronúncias, pelas conversas, pelo vestir. Há uma certa ternura nesta humanidade baralhada e voltada a dar pelo Criador. Ao mesmo tempo, contudo, há uma nota de tristeza nos olhares, uma ausência do espaço primitivo, uma falta de confiança no que partilha o espaço em que habito. Como se olhássemos uns para os outros com uma distância que mina a Babel, um prenúncio da Confusão que deixará a Cidade a meio.

O mercado humaniza tudo isto. Não o mercado selvagem, o capitalismo onde só há lugar para a derrota e para a vitória, onde o perdedor é feito excluído e transformado em número. Mas o mercado no seu sentido antigo, medieval, mediterrânico. A feira é o local de encontro das vontades reais e simuladas, das pessoas e dos afectos, dos afectos e das coisas que passam de mão.

Sinto-me mediterranicamente bem no Jeu de Balle. Ponto de encontro do árabe, do congolês, do flamengo à volta das coisas preteridas e encontradas, dos objectos que morreram para uns e ganham vida nos outros. O direito ao mercado é das mais belas invenções dos homens. Às vezes penso que gostava de ganhar a vida de forma simples, de trocar coisas pelo meu sustento, de ter o meu pano no chão, o meu banco e os meus caixotes, de obter o meu pão no meio da confusão das coisas e dos homens.

É na feira que a Babel ganha sentido.

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